Relatório final da Comissão da Verdade é apresentado
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A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva (CVRP) apresentou, em sua 157ª audiência pública, o relatório final dos seus trabalhos nesta quinta-feira, 12/3. O trabalho está também disponível para consulta em plataforma virtual, através do link verdadeaberta.org, onde constam vídeos das audiências públicas, fotos e documentos levantados.
O presidente da CVRP, deputado Adriano Diogo (PT), abriu a sessão com a oitiva do último discurso público, feito em 1º/4/1964 à Rádio Nacional, do então deputado federal por São Paulo Rubens Paiva, que alertava para a gravidade da situação do país, movido por uma “onda de mentiras” que estavam levando à deposição do presidente João Goulart.
Pedro Dallari, que foi o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, encerrada no dia 10/12/2014, comentou que originalmente não estavam previstas a formação de outras comissões da verdade, mas a sociedade e instituições diversas acabaram criando rapidamente, em todo o Brasil, suas próprias investigações. Ele agradeceu o trabalho de parceria da comissão estadual, que foi a primeira a ser instalada, e que investigou temas que não estavam no escopo original, além de ter estabelecido padrão rigoroso de colheita de depoimentos e documentos.
“O relatório hoje apresentado não é o fim do processo”, continuou Dallari, que ressaltou que o trabalho continua, pois é importante se manter o acompanhamento do cumprimento das recomendações, “para zelar para que seu legado não se perca”. O relatório da CNV está em www.cnv.gov.br.
Memória, verdade e justiça
O trabalho que se encerra com o término das atividades da CVRP na Assembleia Legislativa não é “o ponto final na luta pela memória, verdade e justiça”, disse a coordenadora da CVRP, Maria Amélia Teles. Para ela, “apurar os crimes da ditadura é tarefa imprescindível para pôr fim nos crimes que ocorrem diariamente na democracia. “A decisão tomada pelo STF de anistiar os torturadores reforça a política de esquecimento e autoriza a manter os crimes no momento presente, pois permanece ainda parte do modus operandi da repressão política. Manter os torturadores impunes é manter o Brasil fora da lei no tocante aos direitos humanos”. Ela lamentou ainda que não se tenha tido acesso aos arquivos militares.
O relatório, continuou Amelinha, é composto por 26 capítulos temáticos, 168 casos de pessoas mortas e desaparecidas no Estado de São Paulo, mais 20 investigados ligados à guerrilha do Araguaia, 150 recomendações temáticas, 18 recomendações gerais e o conteúdo desenvolvido por grupos de trabalho e pesquisadores parceiros. Foram lançadas três publicações ” A Sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, o Bagulhão, e Infância Roubada.
Após agradecer a participação de todos os participantes e colaboradores, e também os familiares de mortos e desaparecidos políticos, Amelinha destacou o “esforço e dedicação de Adriano Diogo”.
Responsáveis pela Plataforma Digital, Xenya Bucchioni e Lucas Pretti apresentaram o site. A seguir, alguns dos pesquisadores da CVRP – Thaís Barreto, Raquel Brito, Pádua Fernandes, Vivian Mendes, Maria Carolina Bissoto, Luiz Felipe Loureiro Foresti, Lea Vidigal Medeiros e Renan Quinaglia – falaram sobre os capítulos que foram de sua responsabilidade, dando destaque a alguns dados levantados pelas pesquisas.
Continuidade
Na luta pela justiça, a CVRP terá continuidade na Alesp com a instalação da Comissão da Verdade da Democracia Mães de Maio, afirmou Amelinha Teles. Ela lembrou que o trabalho da CVRP só se encerrará com a punição dos torturadores e a localização dos corpos dos desaparecidos.
Coordenadora e fundadora da ONG Mães de Maio, Débora Silva agradeceu à Comissão da Verdade por “ensinar os caminhos” na luta pelo fim da impunidade. Ela lembrou que, entre os dias 12 e 19 de maio de 2006, cerca de 600 jovens, “pobres, pretos e favelados” foram chacinados, “além dos que estão desaparecidos, enterrados pelo governo do Estado em valas comuns. É uma violência invisível, que se esconde atrás de toucas ninjas e carros escuros”.
Para passar o Brasil a limpo é preciso reconhecer o que acontece na periferia”, continuou Débora, que defendeu a desmilitarização da polícia e a reforma da Justiça, “pois uma mata e a outra encobre”. Dermi Azevedo, ex-preso político, falou que a ditadura “foi o grande laboratório para a violência policial”.
O deputado João Paulo Rillo (PT) informou que lutará pela continuidade dos trabalhos na próxima legislatura, pois “é preciso tentar acabar com o genocídio de jovens da periferia, feito por policiais despreparados e estrutura policial podre”. Rillo ainda considerou o trabalho de Adriano Diogo “a encarnação da dignidade, de luta de um militante de esquerda”.
Vila Socó
Dorvigal Vieira, da Comissão da Verdade da OAB de Cubatão, enalteceu o trabalho da CVRP de investigar, depois de 30 anos, a explosão dos dutos da Petrobrás e o incêndio da Vila Socó, naquela cidade, ao convocar o então ministro das Minas e Energia, Shigueaki Ueki. Esse foi “um crime de lesa-humanidade cometido a céu aberto contra uma população inocente, onde morreram principalmente negros, pobres e nordestinos”.
Vivian Mendes, que cuidou do capítulo do incêndio da Vila Socó, em 1984, afirmou que o número de mortos é incerto ” entre 508 e 700 ” pois a maioria eram crianças, que foram totalmente carbonizadas. Apesar disso, a ditadura contou apenas 93 mortos, para esconder a magnitude do acidente e também para não pagar todas as indenizações devidas.
Fonte:
Alesp