Sem volume morto do Cantareira, Alckmin deixaria população sem água
Artigos relacionados
Cenários avaliam risco de esgotamento; para Sabesp, água dura até março. Nível é de 18%, menos do que foi acrescentado com o volume morto.
O Sistema Cantareira, conjunto de reservatórios de água que abastece a região metropolitana de São Paulo e parte do interior do estado, opera atualmente com apenas 18% de seu volume total. E isso já contando com o chamado volume morto, reserva técnica que passou a ser explorada em 15 de maio. Isso significa que, sem a exploração do volume morto, a água disponível já teria se esgotado.
Se o período de chuvas – que geralmente tem início em outubro – atrasar este ano, há risco de o Sistema Cantareira esgotar suas reservas, de acordo com a avaliação de pesquisadores independentes e de cenário apresentado pelo Grupo Técnico de Assessoramento para Gestão do Sistema Cantareira (GTAC), criado em fevereiro pela Agência Nacional de Águas (ANA) e pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo (DAEE) para estudar formas de lidar com a crise hídrica da região.
O Sistema Cantareira é formado por quatro represas: Jaguari, Jacareí, Cachoeira e Atibainha. Juntas, as represas fornecem água para cerca de 9 milhões de pessoas só na região metropolitana de São Paulo.
Veja abaixo perguntas e respostas sobre o Sistema Cantareira e entenda melhor a situação do abastecimento de água na Região Metropolitana de São Paulo:
Qual é a situação atual do Sistema Cantareira?
Nesta terça-feira (15), o volume armazenado nos reservatórios do Sistema Cantareira era 18% do total. Esse volume chegou a preocupantes 8,2% em 15 de maio, mas subiu quando a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) passou a captar água do chamado volume morto, ou reserva técnica.
Trata-se de uma quantidade de água que fica abaixo do nível de captação usual do sistema e que, por esse motivo, precisa ser bombeada para chegar aos túneis que coletam a água.
A capacidade total do Sistema Cantareira é de 1,46 trilhão de litros, segundo o GTAC. Desse total, 973 bilhões de litros constituem o chamado volume útil, aquele que já era disponível para abastecimento da população. As obras concluídas em maio para a captação do volume morto acrescentaram 182,5 bilhões de litros de água ao total disponível.
Um volume adicional, que fica em um nível ainda mais profundo das represas, não pode ser acessado pelo atual sistema de captação.
Logo após o acréscimo do volume morto, o nível do Sistema Cantareira subiu para um nível de 26,7%, mas já caiu quase 7 pontos percentuais nestes quase 50 dias. Em comparação a anos anteriores, é possível ter uma ideia melhor da gravidade da situação: em 15 de julho de 2013, os reservatórios estavam 55% cheios; em 2012, o índice era de 74,2% e, em 2011, era de 89,5%.
Sem o acréscimo do volume morto, a água já teria acabado?
O volume morto garantiu um acréscimo de 18,5 pontos percentuais ao volume do Cantareira, a partir do dia 15 de maio. Isso significa que o volume total disponível atualmente para captação no Sistema Cantareira é menor do que foi acrescentado com a exploração dessa reserva adicional. A chegada dessa situação já tinha sido prevista por um estudo feito pelo pesquisador Antônio Carlos Zuffo, professor do Departamento de Recursos Hídricos da Unicamp. “Estaríamos sem água se não tivéssemos o volume morto”, diz Zuffo.
Os reservatórios são suficientes para abastecer a população até quando?
Ainda segundo as estimativas do pesquisador Antônio Carlos Zuffo, com o sistema chegando a esse patamar – igual ao do volume morto acrescentado em maio – a água restante deve ser suficiente para apenas mais 90 dias, caso não chova nos próximos meses. Isso significa, de acordo com o pesquisador, que a água pode se esgotar em meados de outubro, se o período chuvoso atrasar.
“A expectativa é de que em outubro comece a chover. Mas houve anos em que a chuva demorou mais para aparecer. Se as chuvas não vierem, há um risco altíssimo de ficarmos sem água”, diz Zuffo.
De acordo com um comunicado divulgado pelo GTAC no final de maio, a Sabesp avaliou a possibilidade de três cenários para os próximos meses, de acordo com as quantidades possíveis de chuvas.
No cenário mais otimista, em que se considera que os níveis de chuva nos próximos meses serão iguais aos menores níveis históricos, as reservas ainda teriam 45 bilhões de litros de água disponíveis no dia 30 de novembro.
No cenário mais pessimista, em que se considera que as chuvas só cheguem a 50% dos menores níveis históricos, os volumes de água disponíveis se esgotariam em 27 de outubro.
Para o ecólogo José Galizia Tundisi, presidente do Instituto Internacional de Ecologia e do Grupo de Estudos Sobre Recursos Hídricos no Brasil, da Academia Brasileira de Ciências, avaliações que determinam quanto tempo devem durar as reservas do Sistema Cantareira ainda são prematuras. No entanto, ele avalia que “se começar a chover regularmente em outubro, acaba o problema de esgotamento do volume morto”.
“Evidentemente, se não chover este ano, se tivermos o mesmo perfil de chuvas que ocorreu no ano passado, teremos enormes problemas de abastecimento da região metropolitana e também do estado de São Paulo”, acrescenta. Em outubro, novembro e dezembro de 2013, a chuva acumulada foi de apenas 283,2 mm, 46% a menos do que a média histórica para a época, que é de 523,2 mm.
A meteorologia pode prever se haverá chuva nos próximos meses?
De acordo com o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC/INPE), esta região de São Paulo tem baixa previsibilidade climática. Há, portanto, iguais chances de a quantidade de chuva seguir a média histórica (média calculada entre os anos de 1961 e 1990), de ficar acima da média ou abaixo da média.
A meteorologista Josélia Pegorim, da Climatempo, lembra que os níveis de chuva deste inverno estão próximos da média para a época. “Todo o problema de abastecimento de água na Grande São Paulo é decorrente da falta de chuva que aconteceu especialmente no verão 2013/2014”, diz.
Segundo ela, não há expectativa de haver chuvas regulares em julho e em agosto. “O quadro de seca vai continuar. A expectativa é que a chuva comece a cair com alguma regularidade mais no final de setembro e principalmente em outubro”, diz. Ainda assim, a possibilidade de as chuvas atrasarem não está descartada.
“Mesmo que comece a chover em outubro, os reservatórios para abastecimento da grande São Paulo só vão começar a sentir os efeitos da chuva o ano que vem. Não é uma semana de chuva que vai resolver o problema. Precisamos ter chuva durante toda a primavera e todo o verão”, diz Josélia.
Algo poderia ter sido feito para evitar a situação atual?
Na avaliação de Tundisi, para evitar a situação de depender totalmente das chuvas dos próximos meses, o racionamento deveria ter sido implantado há muito tempo, além de uma campanha mais forte de incentivo à economia de água.
Segundo o ecólogo, vivemos a maior seca dos últimos 84 anos.
“Esta é a maior crise que tivemos, agravada pelo fato de que agora a sociedade de São Paulo usa muita água para irrigar, abastecer o público e nas hidrovias.”
Ele acrescenta que é preciso insistir em planejamento estratégico de longo prazo.
“Com as mudanças globais, precisamos encontrar alternativas e diferentes possibilidades de uso de água, economia de água e realocação de água.
Seguramente, as mudanças climáticas são as principais causas dos problemas atuais”, diz Tundisi.
Em fevereiro, a Sabesp anunciou um desconto de 30% na conta de água para quem economizasse ao menos 20% em relação à média de consumo do ano anterior.
O bônus foi válido para consumidores abastecidos pelo Sistema Cantareira.
Segundo a Sabesp, até 23 de junho, 87% dos clientes aderiram à economia de água: 55% reduziram o consumo em mais de 20% e 32% reduziram o consumo em uma porcentagem menor.
Na quinta-feira (10), o governador Geraldo Alckmin anunciou que estuda ampliar o bônus de 30% para o período de chuvas.
“O bônus vai continuar, inclusive estamos estudando prolongá-lo mesmo no período das chuvas para poder recuperar as represas”, disse o governador.
Fonte: G1